(...)
Parece que se busca conforto na condição de coisa.
10 Se eu for objeto, isto é, se eu for natureza, meus males
independem de minha vontade. Aliás, o que está em
discussão não é tanto o que os causou, mas como resolvê-los:
13 se eu puder solucioná-los com um remédio ou uma cirurgia,
não preciso responsabilizar-me, a fundo, por eles. Tratarei a
mim mesmo como um objeto.
16 A postura das ciências humanas e da psicanálise é
outra, porém. Muito da experiência humana vem justamente
de nos constituirmos como sujeitos. Esse papel é pesado. Por
19 isso, quando entra ele em crise — quando minha liberdade
de escolher amorosa ou política ou profissionalmente resulta
em sofrimento —, posso aliviar-me procurando uma solução
22 que substitua meu papel de sujeito pelo de objeto.
18. A função sintática exercida por “a mim mesmo”, em “Tratarei a mim mesmo” (l.14-15) corresponde a me e, por essa razão, também seria gramaticalmente correta a seguinte redação: Tratarei-me.
Item ERRADO
O verbo tratar, de acordo com o Dicionário de Regência Verbal de Celso Pedro Luft, não é empregado com a preposição a. Conclui-se que o autor do texto está empregando o verbo na transitividade direta (tratarei), e o objeto direto está preposicionado (a mim mesmo).
O pronome oblíquo me pode substituir tanto o objeto direto quanto o indireto, portanto a substituição de a mim mesmo por me é correta e ambos os elementos (a mim mesmo e me) exercem a mesma função: objeto direto.
O problema da questão, portanto, não está na substituição de a mim mesmo por me, e sim na colocação desse pronome oblíquo que, pelo fato de o verbo estar no futuro do presente do indicativo, obrigatoriamente deve ficar no meio do verbo (mesóclise): tratar-me-ei.
19. O deslocamento do travessão na linha 21 para logo depois de “profissionalmente” (l.20) preservaria a correção gramatical do texto e a coerência da argumentação, com a vantagem de não acumular dois sinais de pontuação juntos.
Item ERRADO
Lendo-se o trecho sem os elementos que estão entre travessões, tem-se:
Por isso, quando entra ele em crise, posso aliviar-me procurando uma solução que substitua meu papel de sujeito pelo de objeto.
Entende-se que, quando ele (o papel de sujeito) entra em crise, o autor pode aliviar essa tensão buscando uma solução que substitua o papel de sujeito pelo de objeto.
O trecho entre travessões explica em que situações o papel de sujeito entra em crise:
— quando minha liberdade de escolher amorosa ou política ou profissionalmente resulta em sofrimento —
Se o travessão fosse deslocado
Por isso, quando entra ele em crise — quando minha liberdade de escolher amorosa ou política ou profissionalmente — resulta em sofrimento, posso aliviar-me procurando uma solução que substitua meu papel de sujeito pelo de objeto.
o trecho sem os travessões passaria a ser:
Por isso, quando entra ele em crise, resulta em sofrimento, posso aliviar-me procurando uma solução que substitua meu papel de sujeito pelo de objeto.
Percebe-se claramente que o sentido foi alterado, portanto não se pode deslocar o segundo travessão.
O fato de haver dois sinais de pontuação juntos na linha 21 tem seus motivos:
1. o autor optou por colocar a explicação entre travessões, por isso a presença do segundo travessão, que não pode ser eliminado;
2. a vírgula se deve ao fato de que o termo ", quando entra ele em crise," está intercalado (Por isso, quando entra ele em crise, posso aliviar-me procurando uma solução que substitua meu papel de sujeito pelo de objeto). A explicação entre travessões foi empregada entre a palavra crise e a vírgula, portanto esta não pode ser eliminada.